O ambiente de 1958 e 59 era bem diferente do dos anos anteriores, anos em que policialmente falando tínhamos no Lubango apenas mais ou menos quatro policias, sendo o Esteves, o Dionísio, o Bírgulas (Ou Toto) e um outro cuja personalidade por não ter sido tão saliente não consigo lembrar-me bem do nome neste momento. Diz a lenda Macongina ter sido esse outro quarto guarda da PSP a quem o famigerado Cabéças roubou o cassetete e a quem numa noite de colégio das madres depois duma tentativa lograda de interpelar a malta agarrou e fez beber uns bons 5 litros de Palhete, dos quais parte ficarambem visíveis a encarnado escuro escorridamente pelo seu dólmen de caqui amarelo abaixo. O Esteves não era para brincadeiras. Foi o primeiro policia a dar-me uma cassetetada, num desses encontros Malta do Internato versus Malta do Tchivinguiro próximo do Hotel Metrópole.
A malta do Tchivinguiro liderada pelo Cabêdo Machado, meteu-se no autocarro a cantar. Cá fora a malta do Internato a berrar. O Esteves polícia estava presente a tentar serenar os ânimos e entretanto o Torrinha mais velho (Escola) passou-lhe a mão em sítio indevido e fui eu quem por sorte amparei a cassetetada dirigida à cabeça com um braço. (É um prazer pagar pelos amigos)·
Eu e o Hugo das Mulas e mais uns cinco ou seis dos nossos, fomos todos a uma farra no Benfica (que saudades). Naturalmente que como sempre entramos à pato. O Hugo apanhou assistência, entusiasmado teve um ataque típico de imaginação romancista exteriorizante, contou algumas histórias e ao lhe perguntarem o que fazia agora que havia sido expulso do internato, declarou com um ar muito solene de prosápia que se dedicava ao contrabando de armas. Precisamente a coisa mais louca e menos oportuna para se dizer nos tempos que corriam.
Depois da farra cansados mas felizes dirigimo-nos para a Pensão Angola. Eis que nos aparece o famigerado Zé dos Calos a pedir guarida. De acordo com a nossa tradição e espírito de então, guarida não se negaria nunca a um colega, nem mesmo a dez , mesmo se por acaso aparecessem todos ao mesmo tempo .
O Zé dos Calos era do Namibe, famoso e carismático, um ex-Marista também, tinha talvez 2 metros ou mais, era magro, usava óculos grossos de aros negros e grandes, quando andava parecia cambalear do alto das suas pernas longas, arqueadas e finas. Tudo quanto dizia era devoz pausada e grave, com aspecto senhoril, intelectual e cariz político.